Bósnia Herzegovina – Outro palco de genocídio visitado

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A Bósnia Herzegovina foi o primeiro país dessa viagem que eu não havia visitado antes. Essa sensação de um país novo sempre tem um gostinho especial para mim. Nesse caso, eu não vislumbrava paisagens estonteantes como na Croácia, de onde acabávamos de sair, depois de três dias atravessando o país.

Baseado na história recente (1992 a 1995) sabíamos que visitaríamos um país que passou por um dos piores conflitos étnicos dos anos 90. Como eu e a Dani já conhecíamos Ruanda , palco do maior massacre étnico do século 20, me preparei para um banho de realidade depois de tanta diversão nos países por onde havíamos passado nesta viagem até então.

mapa
Drubrovnic para Mostar - 148,3 kms
Motorhome na Bósnia Herzegovina
Motorhome entrando na Bósnia

Estávamos saindo de Dubrovnik rumo a Sarajevo e embora fossem apenas 265 km até lá, teríamos duas paradas no caminho.

Visitamos primeiro a caverna de Vjetrenica (que se estende por 2,5 km). Muito legal e me lembrou dos bons tempos de visitas à cavernas no norte da Tailândia. Almoçamos e pegamos a estrada novamente rumo a Mostar. O Crespi me chamou no rádio e disse que estava delirando. "Estou ouvindo U2 no máximo e atravessando a Bósnia de motorhome!". Ele sentiu a mesma sensação que sinto sempre e que é tão difícil de descrever: Liberdade e a  sensação de estar fazendo uma aventura exótica que faz a alegria dos viajantes que gostam do desconhecido.

Paredes cravejadas por balas em Mostar, Bósnia Herzegovina
Paredes cravejadas por balas em Mostar

Assim que chegamos em Mostar, como estávamos em dois motorhomes e a comunicação era feita através de rádio, a Paula chamou nossa atenção e começamos a reparar nas várias casas que guardavam na fachada a memória dos tempos terríveis por que passaram. Estavam cravejadas de buracos de bala, 22 anos depois do fim da guerra. 

A guerra urbana é chocante e no nosso imaginário, temos a sensação de que os soldados continuam circulando pelas mesmas ruas e atirando para todos os lados. As marcas continuam entranhadas lá, como que para não deixar as pessoas esquecerem que uma tentativa de limpeza étnica aconteceu no coração da Europa em plenos anos 90...

 

Estacionamos e andamos uns vinte minutos até chegar à Stari Most (Ponte Velha).

Para nossa agradável surpresa, a área ao redor da ponte velha tinha uma astral bem diferente. Vários restaurantes e bares, além de inúmeras lojas de artesanato local e com centenas de turistas circulando.

Stari Most
Stari Most vista de longe
Stari Most
Ponte restaurada

Em novembro de 1993, a Stari Most (Ponte Velha), construída quatro séculos atrás, foi bombardeada e destruída pelas tropas croatas. Hoje devidamente restaurada, dá a impressão que nada aconteceu, embora tenha a inscrição “Don’t forget 93“ em um pedregulho onde dois morteiros estão cravados até hoje.

Saímos da cidade com un sentimento de ter adorado aquela região em volta da ponte reconstruída mas deprimidos com o entorno onde vimos marcas daquela violência descabida.

 

mapa
Mostar para Sarajevo - 116,9 km

Chegamos quase onze horas da noite no Camping Sarajevo. Estávamos cansados e depois do banho fizemos um aperitivo na nossa sala de estar (o toldo de um dos motorhomes aberto entre os dois, mesa e quatro cadeiras) e fomos dormir. O dia tinha sido longo e intenso.

Motorhomes estacionados no camping Sarajevo, Bósnia-Herzegovina
Sala de estar montada

 

 

No dia seguinte pela manhã fomos conhecer o centro histórico de Sarajevo embaixo de garoa. De novo,  vários prédios com buracos de bala. Outros tantos com várias marcas de buracos cobertos por massa mas com tonalidade diferente na pintura. Fica óbvio o que se passou ali. Acho até que o propósito é esse mesmo. Chocar mesmo depois de passados tantos anos.

Biblioteca Nacional Sarajevo, Bósnia-Herzegovina
Prédio reformado atualmente
Biblioteca Nacional Sarajevo, Bósnia-Herzegovina em chamas
Em chamas - 1992

 

 

 

 

 

 

Placa biblioteca nacional
Placa na porta da Biblioteca Nacional de Sarajevo

O prédio que abriga a biblioteca nacional tem uma placa na porta dizendo que "Aqui, na noite de 25-26 de agosto de 1992 criminosos sérvios colocaram fogo na National and University Library of Bosnia. Mais de 2 milhões de livros e documentos se perderam para sempre. Não esqueçam!".

O prédio foi totalmente reformado e é lindo, mas quando fomos visitar o memorial do Túnel Spasa (Saravejo Tunnel) pudemos ver em salas de projeção, imagens da guerra e entre elas a chocante filmagem do prédio da biblioteca nacional em chamas.

 

Turkish Coffee
Tomando Turkish Coffee
Centro antigo Saravejo
Passeando pelo centro antigo

 

 

 

 

 

 

Andamos pelo centro e experimentamos algumas comidas locais, Burek e Cevapi. Não poderíamos deixar de tomar um Turkish Coffee antes de  seguir para o Tunel Spasa. O túnel foi um marco da resistência de Saravejo durante o cerco à cidade.

Ele começava ao lado do aeroporto e ia até uma região que estava sob domínio dos bósnios a 730 metros de distância. Andamos pelo túnel em um pequeno trecho e pudemos ver filmagens e restos de bombas ainda pelo campo (devidamente isolados). O cerco à Sarajevo pelos sérvios foi o mais longo da história moderna; durou de abril de 1992 até o final de fevereiro de 1996.
Assim como vimos no memorial da guerra do Vietnã em Ho Chi Min ou em Ruanda, a bestialidade de que o ser humano é capaz continua a nos surpreender. Deveriam mostrar imagens desses memoriais nas escolas...

Spasa tunnel
Fachada da entrada de acesso ao túnel
túnel Spasa
Caminhando pelo túnel

 

 

 

 

 

 

 

Morteiros e granadas
Restos de bombas ao redor do túnel Spasa
Mapa na entrada do túnel Spasa
Mapa na entrada do túnel Spasa

 

Seguimos viagem no mesmo dia rumo à Budapeste, Hungria. Fiquei meio frustrado pois não levamos nenhuma multa na Bósnia. Devo ter decepcionado o Crespi...

 

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